sábado, 23 de outubro de 2010

“Uma aparente debilidade que é força”

Desafios à Missão que Bento XVI deixou a Portugal
 A responsabilidade missionária dos portugueses ao longo dos séculos começou por ser valorizada logo a bordo do avião papal, quando - ao falar com os jornalistas no voo Roma-Lisboa – o Santo Padre se referiu a Portugal como “uma grande força da fé católica, que levou esta fé a todas as partes do mundo; uma fé corajosa, inteligente e criativa que soube criar uma grande cultura”. O mesmo fez, horas depois, na homilia do Terreiro do Paço, ao recordar a grandeza dos que, em tempos passados, sem destruir os vínculos da fé e da sua identidade, souberam transplantar experiências e particularidades, abrindo-se ao contributo dos outros, para serem eles próprios, “em aparente debilidade que é força”. Neste contexto, o Papa pediu que Portugal leve à Europa, “o contributo da vossa identidade cultural e religiosa”. Este paradoxo viria a ser desenvolvido ao longo dos quatro dias da visita pastoral.
Mas, como é que um país tão pequeno e cheio de problemas se pode tornar referência para a Europa e para o mundo? Só a para da certeza de que Cristo está presente, explicou o Papa em Lisboa: “Cristo não está a dois mil anos de distância, mas está realmente presente entre nós e dá-nos a Verdade, dá-nos a luz que nos faz viver e encontrar a estrada para o futuro”. Ora, é desta certeza que brota a missão. Por isso, o alerta do Papa: “Colocou-se uma confiança talvez excessiva nas estruturas e nos programas eclesiais, na distribuição de poderes e funções; mas que acontece se o sal se tornar insípido? Para isso, é preciso voltar a anunciar com vigor e alegria o acontecimento da morte e ressurreição de Cristo, coração do cristianismo, fulcro e sustentáculo da nossa fé, alavanca poderosa das nossas certezas, vento impetuoso que varre qualquer medo e indecisão, qualquer dúvida e cálculo humano.”
O testemunho da fé é pois fundamental, “mas é preciso que esta fé se torne vida em cada um de nós”, pediu o Papa em Lisboa.
O mesmo insistiu em Fátima, na Capelinha: “No nosso tempo em que a fé, em vastas zonas da terra, corre o risco de apagar-se como uma chama que já não recebe alimento, a prioridade que está acima de todas é tornar Deus presente neste mundo e abrir aos homens o acesso a Deus”. Assim, “não tenhais medo de falar de Deus e de ostentar sem vergonha os sinais da fé, fazendo resplandecer aos olhos dos vossos contemporâneos a luz de Cristo”.
No dia seguinte, Bento XVI deixou vários alertas contra os efeitos da cultura dominante e do secularismo que tantas vezes nos desviam (a nós e à própria Igreja) do essencial da fé. E foi sobretudo na cidade do Porto, que o Papa volta a pedir testemunhas: “Na realidade, se não fordes vós as testemunhas no próprio ambiente, quem o será em vosso lugar?” A urgência de comunicar esta certeza é pois um mandato, mas sempre a parar do próprio Cristo. “Quanto tempo perdido, quanto trabalho adiado por inadvertência deste ponto! Tudo se define a partir de Cristo, quanto à origem e eficácia da missão”, lembrou o Papa.
É assim que devemos ir ao encontro dos outros. Apesar do actual contexto ser totalmente diferente do que era o dos nossos antepassados: “o campo da missão ad gentes apresenta-se hoje notavelmente alargado e não definível apenas segundo considerações geográficas; realmente aguardam por nós não apenas os povos não cristãos e as terras distantes, mas também os âmbitos sócio-culturais e, sobretudo, os corações que são os verdadeiros destinatários da actividade missionária do povo de Deus”.
O mandato está-nos confiado. Saibamos agora corresponder à confiança depositada... sem medo desta “aparente debilidade” que, afinal, “é força”!

Aura Miguel
(Jornalista da Rádio Renascença)


in Outubro Missionário 2010 - Itinerário de vida e de missão para as comunidades cristãs

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